O Escriba 2

Parte I

O Caos, espaço cultural viseense situado no Largo de S. Teotónio, protegido pelas costas austeras e longevas da Sé, está de parabéns pelo primeiro aniversário. Trata-se ainda de uma criança no mundo artístico, mas daquelas que transportam simultaneamente na sua alma a irreverência e o prodígio inaudito da tenra idade. E, conquanto criança, possui a coragem de um adulto espartano, perseguindo um sonho de crescidos, ainda depositando as francas moedas num porquinho mealheiro. Viseu, e todas as cidades, encontram harmonia no Caos. Neste tipo de Caos. Uma cidade, para além da população humana, carece da população artística. Quem é ela? As ideias, inspirações e pensamentos que ganham corpo nos poemas, nas músicas, nas esculturas, nos quadros… Os espaços culturais são como maternidades que recebem e acolhem, durante algum tempo, esses embriões criativos para que depois, amadurecendo no ouvido, boca e olhar alheio, se integrem na sociedade. Não apagamos as velas em tributo ao Caos somente pelo ano que os segundos ditam. Existe uma exigência de gratidão para quem, afogueando o líquido rubro do romantismo, o mantém vivo. Gratidão, gratidão! O romantismo é o Apocalipse do vazio, esse romeiro cobarde que jamais se revela. Este grupo é imensamente mais do que é (perdoe-me a injúria o verbo ser). Para os comuns passageiros e leitores, tratar-se-á de um espaço de artes e ofícios confinado à dureza básica de umas paredes redundantes. Para os que têm mundos no lugar das pupilas, o Caos revela os homens acima dos homens. É a resistência de um homem sacrificado por amor, o sonho de um homem em formato de vida… Os criadores deste tipo de conceito são os novos heróis de quem ainda acredita na idílica existência do “fazer o que se ama”. O amor convertido em pão, lar e sobrevivência. Estes heróis abdicaram dos fatos garridos, das personalidades duplas e da vida folheada das bandas desenhadas. É verdade, eles já não moram nas nostálgicas Bd’s, mas estão espalhados por todo o país. Estes, em particular, no Largo de S. Teotónio, centro de Viseu.

Parte II

Estive à conversa com Paula Magalhães, uma das fundadoras do Caos. Segundo esta: “O colectivo Caos foi constituído por um grupo de artistas com vontade de participar numa nova experiência de criação/divulgação/partilha/formação e materializado, fisicamente, na Galeria, Atelier “CAOSCasa d’Artes e Ofícios.” Das suas palavras, fica patente a notável versatilidade do espaço cultural, obedecendo a uma estrutura devidamente edificada e transversal a variadas artes. A saber: Galeria Lab – Laboratório de Projectos Artísticos específicos, Performances, apresentação de Livros de Autor e Tertúlias/Palestras. Ateliê: – Dinamização de cursos de curta duração, workshops, oficinas de diferentes disciplinas artísticas – pintura, desenho, gravura, fotografia – com agentes locais e nacionais; – Aulas semanais de desenho, pintura; – Ateliê livre – espaço de trabalho, criação de projectos e recuperação de ofícios locais. Serviço Educativo – com oficinas e outras práticas artísticas que possam vir a ser complementares à oferta do espaço e permitindo um campo de acção mais abrangente. Laboratório de Fotografia: – Laboratório para criação de projectos no âmbito da fotografia analógica e processos alternativos de fotografia. – Oficinas de processos alternativos de fotografia, fotografia analógica e digital. BAR | e espaço co-work: – Serviço de apoio às actividades dinamizadas; – “showcooking” com produtos locais – Lançamento de produtos locais; – lançamento de vinhos com rótulos artísticos/design de produtos singulares. Paula Magalhães lamenta o elevado nível de renda que o espaço implica e a ausência de amparos municipais, todavia, as dificuldades são fintadas pelo empreendorismo e dinâmica dos integrantes do projecto Caos. José Crúzio responsabiliza-se pelos convites dirigidos a artistas destinados a ocupar a galeria. O atelier, esse, é gerido por Paula Magalhães e Luís Calheiros. É esta a trindade criativa que emerge no solo cultural viseense, qual flor afoita e cândida alimentada por um sol enfático. Apesar dos óbices atrás escritos, a artista congratula-se e perspectiva o futuro: “Vamos tendo um público simpático a visitar o espaço e a participar nos eventos ou oficinas, passou um ano e as pessoas já nos vão conhecendo… Esperamos aguentar mais uns anos e crescer com o projecto. O próximo passo será trabalhar em torno dos ofícios, contamos trazer um artesão (talvez de mês a mês) para fazer uma tarde livre no Caos, onde possa expor o seu trabalho, falar da sua arte e ensinar quem queira aprender. Penso que daqui a alguns meses já estamos preparados para fazer uma recolha dos ofícios da cidade. Gostava de ficar com um registo de vídeo pois sei que daqui a uns anos vai desaparecer quase tudo e é uma coisa que me assusta um bocadinho.” E, invocando a última linha da carta de apresentação do Caos, lanço a sugestão: visitem esta casa, que também é vossa! Nota: Francisco da Paixão opta por escrever sem as regras do novo acordo ortográfico

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